sexta-feira, 29 de março de 2013

E então, que quereis?


Fiz ranger as folhas de jornal

abrindo-lhes as pálpebras piscantes.

E logo

de cada fronteira distante

subiu um cheiro de pólvora

perseguindo-me até em casa.

Nestes últimos vinte anos

nada de novo há

no rugir das tempestades.
Não estamos alegres,

é certo,

mas também por que razão

haveríamos de ficar tristes?

O mar da história

é agitado.

As ameaças

e as guerras

havemos de atravessá-las,

rompê-las ao meio,

cortando-as

como uma quilha corta

as ondas.
(1927)

sábado, 9 de março de 2013


Para o século 21


Esta última semana me trouxe uma certa angústia: meus filhos não sabem de nada ainda sobre o mundo, sequer conhecem os limites da terra em que vivem, são pequenos demais; “Papai, quando eu voltar pro Brasil, a gente pode tomar sorvete?”, saindo da Gávea para Botafogo. Tempo e espaço ainda estão sendo construídos, essa inocência traz um torpor de ideias, uma geleia doce de pensamentos..., mas e o Trem azul? Dinossauros e iluminadas frações de fabulações sobre a vida, isso tudo ficará onde?
Sei que ainda terão a oportunidade de conhecer e conhecer é um prazer dos maiores que experimentamos; a liberdade que vivenciam nesse primeiro momento vai sendo substituída por nossas verdades, indicações de sentido, um GPS programado para dirigir o que podem ou não pensar, uma estética que tenta unificar o que é tão diverso.
Podemos ter algumas certezas e dizê-las, devemos orientar os caminhos para que sejam menos espinhosos, mas falo aqui de sonhos. Tenho ouvido tantas opiniões definitivas sobre todas as coisas que imagino que o final do mundo de fato está para chegar. Conheço pessoas todas inteligentes, capazes de fechar um conceito em definição em apenas um gole de vinho, isso me preocupa...e as definições são as mais secas... recentemente, bisbilhotando conversas em redes sociais, vi dois jovens discutindo acerca da morte de Hugo Chávez...o desejo de perpetuar a intolerância em nome de uma análise reles me estarreceu.
Minha humilde percepção do mundo registra e marca a incapacidade que estamos tendo de entender o que não está no default, as compras de felicidade parecem dar conta do que precisamos e ponto final...se aquele outro ali não concordar, que morra, que sonho que nada, já era la revolución...
Para o século 21, o que estará por vir? Os dinossauros entraram em extinção, mas em determinada fase de nossas vidas eles voltam com tanta força em vários formatos e texturas que parecem reais, meu filho imita o som (suposto) daquele monstruoso e adorável esquisito na luta eterna que já aprendeu de ser humano, mais forte de todos...isso me preocupa. Para o século 21, queria garantir a eles, minha menina e meu menino, a impossibilidade de tantas certezas, a fluidez do pensamento sem tantas formas pré-concebidas, substituir, quem sabe, os heróis de poliuretano por gente que pensa coletivamente.
Já sei: “ih, quanta bobagem!”

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Pão + X + Y




Nunca penso em números
E quando faço, erro.
Enganos.
Mau ensinamento.

Me preocupo às vezes
Imagino-me com mais destreza,
Cálculos recriam o universo
Também.

Se talvez...
Mais uma vez isso,
Que palavras!
Mania de querer reedificar,
Transmutar o que já foi.

Quando penso em números
Me inervo: a conta,
O metro quadrado, as probabilidades...
Prefiro pensar nas formas
Que é outra maneira de saber os números.

Enquanto isso,
Ao mesmo tempo,
Me perdôo e me lembro
Do pão que acabei de assar!