sexta-feira, 9 de dezembro de 2016


A Família Dionti, de Alan Minas

 

A Família Dionti, texto de Alan Minas, publicado pela Berlendis & Vertecchia Editores, é uma instigante e deliciosa narrativa cuja experiência ficcional nos traga para o olho de um furacão, uma espécie de desvio, uma estrada renovada, um susto, uma risada, um suspiro de alívio, uma saudade... texto carregado de marcações, fruto de um trabalho intenso de busca pela palavra certa, mesmo que, por vezes (pouquíssimas),  nos leve ao excesso da adjetivação, nada  compromete o encanto da criação dos espaços e suas importâncias. Recria palavras, desenvolve um troca-troca semântico inebriante: “Desatou o olhar, palitou o resto da comida e das coisas não ditas agarradas entre os dentes”.

Há uma busca incessante por universos internos que passeia em campos semânticos de raíz, sonho, entender-se... é uma filosofia de quem conhece o mundo pelo empirismo. Personagens que brotam dos fonemas, morfemas, da força da linguagem; uma gama enorme de figuras que transitam ora etéreas, ora concretas nos espaços da narrativa. Tempo e Saudade alcançam categoria de personagem, há a Água também que lava traições, esbanja amores...

Capítulos? Quando abertos, somos encaminhados para o olhar daquele personagem, mas, como na vida, tudo se mistura. Personagens que têm suas ações no conceito do seu nome, por exemplo, Sono, com letra maiúscula, que entra em cena, não apenas a brecha da vida que temos para o descanso, mas uma persona que, sorrateiramente, domina o quarto de Kleiton e Sirino e os faz imergir na noite.

O nome dos personagens é um capítulo à parte: Pedro Muito, Poesina, Salvador (o farmacêutico), Intromelissa, Dona Centenádia, Dona citronela, entre outros, trazem a leveza, a diversão, o humor, a reflexão...esses personagens são descritos com delicadeza, profundos segredos revelados por um narrador que desconhece imparcialidade.

Há um “Surrealismo” entre aspas que se adensa à medida em que, sem trégua, somos submersos nas fantasias propostas pelo enredo: açúcar puro, no mais primitivo de seu doce. “Ilusângela usou o dedo mínimo para acionar o pequeno botão desbotado no canto da foto, deu a partida. As engrenagens da roda-gigante voltaram a funcionar. As luzes, o realejo, tudo alcançou um brilho intenso, e o brinquedo voltou a girar, a girar... sem tempo para acabar.”

Há criatividade sintática, nada que subverta por subverter, mas por torná-la também personagem dos personagens, a estrutura da língua está a serviço de sua criação.

O enredo acontece com histórias paralelas ricas em curiosidades: Kelton, desreprezado, se esvai enquanto Sirino, ressequido, saudade pura, desmancha-se em terra, poeira, ciscos... Irmãos nessa família em que Josué, pai “contido nas três letras”, manobra a ausênciafuga da mãe... a existência do “medo de somar saudades”. O padre se consulta com Vaidalva, a rezadeira de Mundeiró, o médico, Sofia e Samanda, disputando bonitezas, Vô Abelino...uma beleza.

Amores, pureza, enxurradas, vazamentos, corredeiras, uma história de muitas correntes...

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Crítica instigante! Passa uma enorme vontade de viajar nessa leveza. Quero assistir!

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