quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Como você reza?

Fernando Arosa
Retomei minhas leituras, ainda saindo de um tempo de alienação (todos nós temos esse direito), e me coloquei no mundo novamente. Achei que podia ter ficado lá um pouco mais, naquela Pasárgada revisitada, pois o que vejo aqui não me faz “amigo do rei”.
            Passo os olhos no noticiário, já morto pelo tempo, e não pude me alienar novamente: o véu está proibido.
            Lembro-me da minha primeira experiência religiosa, ou melhor, da minha primeira incursão no mundo da reflexão. Ainda pequeno de tamanho e de vivência, acompanhei a passagem de uma procissão. Lembro dela como se fosse hoje: cantoria, imagem do “senhor morto” (quanta dúvida!!! Senhor? Morto? Uma estátua? Deitada!!!), umas pessoas descalças, outras vestidas para passeio, um incenso, minha mãe, meu pai, velas, minha avó e outras senhoras com véu de renda, umas em preto, outras em branco. Era tudo muito envolvido em um tom de som que invade o peito e provoca choro, tive vontade de chorar sem saber o motivo.
            Pensava, naquele momento, que o senhor morto estava indo para um lugar em que ficaria bem, otimista que era. Minha reflexão maior veio da tristeza, da disposição das pessoas em procissão (por que as mais arrumadas iam na frente e as mais simples iam lá atrás?) e o que mais me intrigava era o véu. Mais tarde soube que o véu católico representava respeito, retidão. Vi, durante algum tempo, algumas senhoras com véu, na missa, na rua, na vida. Mas ali era permitida a retidão e seu véu.
            Atualmente não vejo mais católicos retidos em vestimenta significativa, não por proibição, mas por um tempo em que a crença modernizada abriu espaço para outras formas de expressão.       
            Volto ao noticiário, depois dessas lembranças, e retorno ao tempo de escola quando aprendi que da França vieram ideais que transformaram o modo de pensar em todo o ocidente: liberdade, igualdade e fraternidade. Que lição, que coragem, que revolução! Os tempos mudaram e, em nome da segurança, o véu islâmico foi proibido na França.
            Crenças são crenças e devem ser respeitadas. Minha formação cristã me permite reafirmar isso e crer que algo errado acontece no velho continente. A imigração, os movimentos humanos pela Terra, sempre aconteceram e com eles o medo da diferença vem à tona. Como enfrentar essa questão? Acho que tolerância, já gasta em palavra, é a prática que devemos exercitar. O direito de cada um é o direito de todos. Burca, niqab, véu, crucifixo, turbante, qualquer símbolo que traduz uma crença deve ser visto como liberdade, direito, filosofia de vida.
            E a humanidade se perde mais um pouco...


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