Bisnaga ou baguete?
Contam que o Sr. Antônio da
padaria da esquina chegou ao Brasil ainda muito novo, com a família, na década
de 1940. Assim como ele, muitos vieram e se instalaram no Rio, e em São Paulo,
trazendo na mala os sonhos transcritos na carta de Pero Vaz.
O Rio de Janeiro era outro, assim
como Sr. Antônio virou um carioca da gema, ô pá! Sorria com facilidade, enxergava
a vida com certa leveza e o fado não o toca tão profundamente como o samba de
roda, mas Antônio cresceu atrás do balcão da padaria que, aos poucos, foi
tomando formato com seus ladrilhos e balcão; o relógio na parede marcava a
fornada e o bairro sentia o aroma do pão fresquinho.
Quando eu era criança, o pão era
bisnaga e o relógio orientava os passantes sobre a posição do dia. O pão
careca, o pão doce, o sonho com seu creme, o pudim de pão criavam o cenário da
padaria do português que enriquecia, trabalhando de sol a sol, de domingo a
domingo. Já ia esquecendo das roscas de polvilho e dos grandes pedaços de bolo
com cobertura de banana ou abacaxi. A padaria servia no copo de vidro seu café
coado puro ou pingado, vendia o leite em saquinhos de plástico, não mais em
garrafas de vidro, que ao ferver, criavam a nata que mais tarde serviriam para
os biscoitos. Era o bom dia e era o boa tarde das casas cariocas. No fim da
tarde, lá pelas quatro, cindo horas, havia o lanche com o pão recém-saído do
forno, e a vida era mais simples.
Ontem, quis me certificar da hora
e não achei o relógio na parede da padaria de uma esquina por onde eu passava.
Resolvi entrar e pedir uma bisnaga. O atendente do balcão não sabia o que era,
chamou o gerente que me ofereceu uma baguete, o que, definitivamente, não é a
mesma coisa. O balcão, iluminado, fazia brilhar os doces finos e as tortas
maquiadas, estrelas de um cinema industrial.
Saí e, num instante, avistei,
sentado numa mesinha ao fundo, lendo o jornal, com sua boina azul marinho, Sr.
Antônio, o português da padaria, já idoso, tomando seu café no copo de vidro...
(Publicada em www.bafafa.com.br)
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